domingo, 8 de janeiro de 2012

Festa de Família

Reunir-se-ão filhos, pais, netos, bisnetos e as ramificações adjacentes naquela festa cheia de rememorações à esmo – uns primos que numa mesa se refugiavam cheios de nostalgia, àqueles anos oitenta! Ah, aqueles anos oitenta! Quais almas não se enterneceriam só de olhar para trás, por cima dos ombros – olhe, eu queria tanto ter nascido lá, não vivido, nascido, veja bem, que para mim, os anos noventa, aquela bendita ressaca, hum..., aquela ressaca é que pareceria ser o lugar da juventude feliz, por mais contraditório que se seja.
Mas não. Nã-nã-nã-nã-nã-nã-nã-nã-nã-não. Quis alguém, além da idade já avançada, que a chuva de herdeiros do sobrenome fosse àquela época, e cresceram todos juntos.
Na verdade não estarei lá; mas vejo duas mesas bem distintas. A mesa de minhas tias a conversar, cada uma talvez receando, uh, dedos e dentes de rancor, é claro, pois as famílias guardam dessas coisas; entretanto, conversam, algumas ao copo da cerveja, outras não; uma apertada em seu vestido largo, ou ainda em seus jeans justíssimos, cintilantes cristais, outra em cores, outra em imitação de pele de onça – ali no cantinho, sorrindo de canto aquela tia viúva, sem muito em comum, constrangida pelo largo silêncio e ao seu pé o filho também em silêncio, que sai vez por outra para sentar-se à outra mesa, onde risadas explodem frenéticas sobre os casos de infância e adolescência, brincadeiras, brigas, que aqui e agora são tratadas com felicidade galhofeira, antes, ah, antes foram pau feio entre os primos, e ri, aquele mais tímido, sem no entanto nós sabermos que em sua cabeça vai meio enevoado o episódio, e àquela época fora ruim, sim.
Faço este parágrafo aqui para que o outro não se estenda, pois que não quero que nenhuns de vós percam nada do regozijo de minha alma em prever o futuro – e sei que em blogues um parágrafo mais longo faz diferença entre ir adiante ou fechar a página.
No mais, a mesa de primos e primas fala de Menudos, fala de Dominó, talvez entre aqui e ali um ídolo daquele tempo, talvez entre acolá um desenho, uma série, um filme, uma novela – ai, que novelas! Aí que surjam certos segredos que nem aqui serão revelados, mas, a certa altura em que saiam da infância para chegar à adolescência, em meio a risadinhas de escárnio, hum, aquele olhar desconfiado e singelo do segredo escondido, pois chega o marido, senta-se à mesa, dando um beijo no rosto daquela e a esposa vai ali cuidando do filho e pede ajuda com a bolsinha das fraudas – mas que lá fique, por favor, que certas coisas mudaram... Ora, vão-se aí sabe lá quantos anos!
E enfim os filhos, primos de segundo grau, que correm batem-se, esbarram em suas birras e más criações, nas suas vontades, nos seus mimalhos nojentos – como o são o de todas as crianças, entretanto umas mais que outras, já que, ai, lá vem o dinheiro que o pai não tivera outrora, e que, tanto tem agora, que acabará por implantar cabelos, que vão-se escasseando em sua fronte, mas não tanto, vá lá, vaidade dele e intromissão minha, mas a criança, essa sim... e, mais que esforcem todas elas, surge aquela confusão no fim da festa que faz uma mocinha chorar e explodir uma confusão monumental, mas não a ponto de fazer todos irem embora, porque sempre surgirá um que vai dizer assim,
– ora, senhores! Somos uma família! ao que todos vão se sentando, pondo suas crianças a dormir, e, à meia-noite talvez alguém diga que se vai, enquanto uns e outros mais nostálgicos permanecerão, à custa de raivas dos respectivos maridos e esposas, além da birra dos filhos. Lá pelas tantas, alguém dar-se-á conta da ausência de um ou outro, pegando-se a contar, no fim da festa quantos e quais primos vieram ou não vieram – é nessa hora que vão dizer,
– aquele lá é um esquisito! nem veio!
Mas ninguém se lembrará – ora, já daqui contarão com a minha ausência. Num outro dia vão se perguntar, e questionar, e embirrar, e dirão em uníssono que apregoo por aí a desunião como aquela qual e aquela tal.
Ora, eu estaria bêbado estivesse lá, falando mais que devo, não sendo engraçado como prezo e passando vexame pela minha eterna sensação de estrangeirismo – que nem em berço familiar se desfaz... É...
Por isso que já digo daqui para dezembro: Passar bem, muito bem, senhoras e senhores, não é difícil prever o óbvio!
eap

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