segunda-feira, 1 de junho de 2015

curriculum vitæ*

(*do latim: "trajetória de vida)

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DADOS

nome completo, não dou,
dou primeiro nome, que é como gosto de ser chamado
se calhar atendo por apelido -- grosseiro ou carinhoso.

meu endereço é o universo, amanhã pode ser
um labirinto na minha cabeça,
pode ser que caiba explicar
que fui jogado para os vermes,
quando enfim o fim for enfim.

minha idade, de vida
hoje 23,
mas daqui para as 17 h meu humor será de 80,
caso não me deixem sair daqui,
caso surja algo que me leve até as 21 h
mas meu cerébro funciona como se eu tivesse 16
e às vezes a solidão me põe no vácuo temporal
de um solteirão aos 30.
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IDIOMAS

sei falar a língua das árvores,
calmo balançar com a adaptabilidade
das redes onde  fui acostumado a lhes imitar
seus meneios de braço e ciciar de folha-na-folha.

já fui mestre do tatibitati, aliás,
no paraíso dos gatos não ouso pisar
pela vez em que corroborei com um crime
e arrependi-me, porém, a justiça felina é cruel,
olho por olho, dente por dente.

e a língua dos bebês, que quando choram
saibam que nada é tudo e tudo é nada,
dentro de seus pequenos universos extraterrestres
onde até ali, mesmo longe de seus reinos
(por alguns anos) ainda são reis,
para que logo após depostos, virarem escravos.
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EXPERIÊNCIAS

já trabalhei em horários diversos,
velei o sono de todos os meus amores
fiz ascender a alma até o universo
o maior arquiteto de todos os sonhadores

do sol consegui a iluminação ideal 
para das luas refletir as ruas e fazer carrosséis;
com o néon fiz da cruz o primeiro sinal
da galáxia fiz um troféu: saturno e seus anéis.

inventei a roda da minha própria fortuna
deslizei então pelos vales do infortúnio
apenas para testar se era oportuna
a invenção mais falha para este mundo

e como se não bastasse inventor,
desenhei poemas por quinze anos
evitando rimar amor com dor
mas veja só a que rima chegamos.

fui pairmão por alguns filhos e filhas,
amante regular com tendência a marido
mas de tanto navegar, mais de mil milhas
acabei por satisfeito como desaparecido.

mas que me fio em ser verdadeiro
e em verdade te prometo, te juro
que vou sendo chamado por cada janeiro
e no fim, em dezembro, esconjuro.

calei a boca do universo, quando homem
o que eu disse ainda ecoa profundo
vocês chamam de infinito, mas tem nome:
o silêncio é meu grito pelo tudo.

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OBJETIVOS

junto a vocês, nada acrescento
além da novidade última
que tiver que surgir.
entenda que meus feitos
nunca me fizeram nada além
do que lamento
mas o que há por vir?

teria no cheiro de mofo
de minhas roupas encharcadas
da última chuva
algum ser vivente
mais propício ao nada que eu?
que vocês?
que essa vida inteira?

qual o sentido da pergunta,
da carreira
da vida
que ligeira passa
e conforme os anos vem
nós vamos
e os fantasmas de quintana
quintanam
como as pedras de drummond
estão no caminho
e o eco de bandeira
faz cem anos que repete:
 trinta e três, trinta e três, trinta e três...

eu quero ser o objeto
que se torna filho
que se torna mimo
que se torna afã de se ser,
eu quero ser pó da madeira,
o bicho que apodrece a fruta,
o vento que bate as portas.

eu já fui a criança, menino, rapaz, homem,
quero ser velho, quero ser velho de fato,
da carranca e dos netos,
quero ser plantado na terra,
queimado no fogo,
congelado nas águas glaciais
desfeito no ar,
vira partícula subatômica,
sumir no buraco negro,
inexistir
por já ter
existido demais.

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