terça-feira, 30 de janeiro de 2018

ex-futuro

lá vai ele
o ex-futuro escritor
do livro jamais escrito
definitivo
da literatura brasileira.

era tão formoso o verso,
era tão crua a prosa.

tem jeito de que vai se enviesar
pelo caminho certo

mas que nada

hoje eu sou sombra
daquilo que fui
mas é um sentimento
estranho

pois me sinto um homem melhor
mas não me sinto
tão
poeta

me sinto menos perdido
apesar
de não ter ainda
encontrado
meu caminho

me sinto grande
estando
do mesmo tamanho

me sinto feliz
enquanto triste
ensimesmado

mas, olha:
eu não me troco
nem pelo troco
de versos bem-feitos.

de alguma forma
sinto que o que sou
é quase tudo
o que nunca quis
mas hoje prefiro.

parece confuso
mas prefiro essa incerteza ampla
que a faca de gume cego
que insiste em traçar
uma linha
impossível.

sei da minha poesia menor
não hei de melhorá-la
tampouco ela piorará.

mas, cá está: tais versinhos
pequenos como os sonhos
de 4 horas de sono
diários.

e lá vou eu,
quem sabe,
ex-futuro do passado
presente
e ciente
de que daqui
não passo
mas passo bem,
obrigado
.

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

mi cariño

as ruas que andamos
existem
de outras formas
como antes fossem

fotografias recortadas
de um tempo que só segue em frente

tudo o que me move
é estar sempre indo

por mais que em momentos como esse
em que me vejo
revisitando o passado
eu crie muito mais
do que deveria

na verdade
há um carinho pelo meu próprio jeito
de ser ambicioso por tudo isso

mas, de verdade,
que o passado
é uma casa demolida
onde antes
não havia espaço para o futuro

é tempo de reformas
e, tudo o que importa
é uma janela
ampla
para tudo o que vem

sou um homem de desejos simples
de poucas palavras
de fala mansa
de pavio curto
e muito de um pouco de tudo - que é quase nada

e, só de ter
as paredes brancas de agora
impregnadas com o meu suor
e os mosquitos
com lorelei ao fundo
dormindo
já me vejo pondo os primeiros tijolos de uma nova casa
as primeiras palavras de uma folha inteiramente branca

sem esquecer que há uma lixeira com erros imensos
e garranchos que não vou mostrar a ninguém

Disparate para N.O.A.

Queria te encontrar para dizer que estou feliz por ver que as coisas têm dado certo para você - sim, eu sei que estão, e você sabe que eu sei.

E, por incrível que pareça eu lembro dos nossos últimos momentos com certa amargura mas com um tom de misticismo que eu nunca entenderei como pude ter tido tanta certeza do que fazia. Porque, por mais que nos amássemos (e nos amávamos), sentia em meu peito que eu era um vírus para a sua vida.

Embora a cidade tenha ficado pequena demais para você, com todas as ruas dando de encontro para o seu rosto, é certo que retirar a única pedra de sustentação do teu caminho foi a melhor coisa que eu poderia ter feito por você. Claro, que, ao falar isso posso estar dizendo que eu era para você como se fosse um deus - mas eu e você sabíamos e sabemos ainda que deuses não existem e eu também não me consideraria um.

Lembrei, enquanto me agraciava com tuas vitórias, da história do cara que chuta uma tal vaca do precipício, mesmo sabendo que essa vaca era a única fonte e sustento de uma família. Logo depois ele volta e vê que a família prosperou.

Diferente da família que não via um futuro pela frente, eu enxergava em ti todo o potencial que uma vez vi em 2009, quando éramos amigos, ainda na batalha - daonde o nosso amigo Metal está hoje em Novo México - e eu sabia que tudo o que fazíamos era um desperdício.

Não digo com isso que me arrependo. De jeito nenhum, a vida segue, e o máximo que podemos fazer é pegar carona nela.

Mas ao me chutar da tua vida rumo ao precipício, não posso deixar de crer que você cresceu e muito e grande. Era esse o estímulo que você precisava. E, claro, sinto muito se fui rude no modo como pus as coisas ou se nos momentos seguintes as coisas ficaram mal esclarecidas.

O fato é que, eu sempre serei um vírus - e não falo isso para me autodepreciar, é da minha natureza isso. Nunca fui a sustentação que eu mesmo precisei e me sentia culpado de não ser a que você precisava naquele momento.

Assim sendo, a única coisa que fica para a minha própria reflexão é saber o que preciso chutar de minha vida para que ela comece a dar certo?

Será que você sabe a resposta?

De qualquer maneira, em algum momento eu posso estar sendo o vírus de outra pessoa, mas eu não o quero ser. Só que desta vez, ao invés de refazer o que fiz, vou procurar a única saída possível que é obter o melhor que o esforço real por algo real é capaz de oferecer.

E é isso que você tem que eu ainda não tive.

Precisei esperar 26 anos para descobrir que até aqui viver não passou de uma mentira e que os planos de verdade vão começar agora. É o fim da letargia.

Nunca poderei dizer isso pessoalmente, mas sei que você sabe que pode me encontrar aqui. E quando estiver lendo isso, saiba que estou verdadeiramente feliz pelo rumo que a tua vida tomou.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

onde está a poesia que estava aqui

onde está a poesia?

um dia a tive
no peito,
hoje, só a tenho
nos livros.

um dia a tive nos momentos
mais singulares
hoje não a encontro
em lugar nenhum.

um dia a fiz,
outro dia,
apaguei.

outro dia tentei,
no mesmo dia,
fracassei.

onde está a poesia
que estava aqui?

já me perguntei,
já saí nas ruas a procurar,
perguntei aos meus amigos,
se em alguma rima
ela poderia estar.

mas não mais a encontrei,
a poesia está morta
em seu lugar, perto
de mim, putrefata;
hoje, tenho
contas
em seu lugar
tenho tudo
o que sempre quis
longe.

mas, se ainda há, não sei
mas se há, não a sinto ou tenho.

se ela não está
como podem existir
os versos de agora?

a poesia não pode morrer
sem que uma única vez
tenha vivido.

assim, como é,
tema de metapoema

a poesia é apenas
a junção de palavras
sem forma
sobre a forma
e a forma
- não se escrevem manuais de poesia
ela nasce
feita
sem escolha -

tudo o que ela era,
foi,
ou será,
acaba de ir embora.

eu não a matei,
tampouco a dei à luz,
ela simplesmente
criou vida,
tem RG e CPF
Título de Eleitor
CNH - a qual pegou a estrada
e deixou a porta aberta

e um ninho
vazio

mas se a poesia realmente existe
ela está escondida
mas ocupada
em rugas
concreto
num rosto sério
que nem se esperança
nem se desespera.

a poesia, meus amigos,
quando vem
não espera,

e é por isso que eu deixo
a porta sempre aberta