sexta-feira, 31 de maio de 2024

pulso

tropeço nas pedras, inválido.
consigo premeditar o estampido
porém, refém da gravidade, caio,
boca na sarjeta pr’onde verte o córrego
e na rua escura, minha tragédia
é rir da comédia que faz chorar.
as feridas vertem sangue
que se misturam às turvas águas.
já acodem meu corpo,
peso de uma vida a reboque
de uma desenganada morbidez
que floresce do descaso
com que venho tratado a mim.
escolho o sofrimento pelo conforto
e essas palavras pululam a derme
encharcada de sujeira que, satisfeito,
recolho de mão cheia.
voltam velhos pensamentos,
mas com tal intensidade,
que chegam às vias de fato,
enquanto recolho meus ossos e gordura.
o doutor-açougueiro sutura
o rombo abissal que me amedronta
e me fascina;
profere palavras de cautela
enquanto a inflamação lancina
fisga firmemente e febrila
madrugada adentro, alucinado,
confeccionando a mortalha de minha algoz
que porta bate estaca
enquanto sua silhueta se agiganta.
febril, 39 graus.
vocifero blasfêmias como possuído,
mas não há demônio,
somente o pobre diabo,
que desejou ter partido infeccionado
untado num sarcófago de cera
feita de meu próprio pus enrijecido.

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